Antes de ler o texto, é de sumária importância você assistir ao vídeo para podermos discutir sobre o tema apontado no artigo.
Ao assistir os minutos da frenética perseguição, o espectador fica com algumas dúvidas agoniantes no pensamento: "Será que conseguirá a vítima fugir dos marginais?"; "Conseguirá fugir ileso, sem sofrer disparos de arma de fogo nas costas ou cair ao solo?" ; "Irá sobreviver?"
Último aviso, antes de prosseguir na leitura, veja o vídeo !!
Passado o susto de lombadas, quase acidentes, e diversas outras infrações de trânsito sob disparos de arma de fogo (eu ouvi um estalo que acredito ser do escapamento da moto) observamos o pobre condutor parando com medo e entregando seu bem material - a motocicleta - que tanto lutou para comprar à canalha do crime.
Eis que ao descer da moto, a surpresa. Após vários minutos de perseguição, que chegam de acordo do velocímetro da moto a 130 Km/h em vias residenciais que não se deve passar dos 30 Kms/h trata-se de uma irresponsável e errada brincadeira alusiva ao crescente preço dos alimentos no país.
E quais consequências desse ato irresponsável e impensado poderiam acarretar para um cidadão armado que vislumbrasse o assalto? Se isso ocorresse na frente da sua casa, como ocorreu defronte o quintal de um cidadão; quais as consequências para um cidadão armado que tem a posse de arma de fogo? Ou o cidadão que possua o porte de arma? Para um agente da lei, seja civil ou militar, quais as consequências na vida, carreira, liberdade perante a atitude infantil e imatura dos condutores das motos?
É o que estudaremos à seguir.
Vamos supor que o leitor esteja em sua residência e que tal perseguição termine em seu quintal aberto, ou; o leitor tenha porte de arma de fogo. Que assista a toda a situação, que é explorada pela mídia nacional (roubo/latrocínio envolvendo motos), bem como redes sociais sobre o roubo de motocicletas esportivas.
A cena é clara: um condutor de uma motocicleta pilotando acima da velocidade em via coletora, olhando para trás; logo em seguida, duas pessoas sobre uma outra motocicleta de potência considerável ( A motocicleta Honda/Falcon é utilizada até hoje como viatura policial), estando o garupa com a mão no bolso.
Barulho de estalos.
Mais estalos.
Os elementos levam o civil que possua uma de fogo à crer, sem sombra de dúvidas o inevitável: trata-se de uma tentativa de assalto à motocicleta. Coloque-se então na função de agente da Lei. Em patrulhamento uma motocicleta de grande porte e potência passa por você em via pública. Logo atrás outra motocicleta com dois indivíduos. Estalos. Mais estalos.
Os elementos apresentados apontam, sem sombra de dúvidas, estar ali ocorrendo uma tentativa de assalto. Não há dúvidas quanto à tentativa de obtenção de bem alheio móvel mediante grave ameaça, principalmente ao se ouvir os barulhos de estalos, que vide o clamor do que ocorre levam a crer em ser disparos de uma arma de fogo. Vidas correm risco.
Eis que a infantil e imatura brincadeira toma forma em uma via deserta.
Após a abordagem, que se apresenta de maneira agressiva e imperativa, os "algozes" arrebatam um saco de feijão. E vão embora.
Mais de sete minutos de perseguição, quem levam à crer sob todos os fatos que se tratava de um assalto com periclitação de vida dos envolvidos e terceiros transforma-se em uma brincadeira de absoluto mal gosto.
Independente da infantilidade dos autores do vídeo, trago à reflexão ao leitor atirador, colecionador, possuidor ou portador de armas de fogo: E se você tivesse tomado uma atitude com sua arma de fogo na tentativa de salvar a vida do jovem que filmava tudo, quais seriam as consequências para sua vida?
Levo à reflexão aos agentes da Lei que observaram o vídeo: quais seriam as consequências na sua vida pessoal, profissional se tivesse utilizado de sua arma de fogo ao ouvir os estalos e efetuar disparos, claramente embasados então na excludente de ilicitude? Se tal perseguição tivesse ocorrido em ambiente de baixa luminosidade, quais seriam as consequências para a vida do agente; para a vida dos autores do vídeo; para a Instituição policial?
.......decerto, o vídeo toca em um assunto jurídico aqui necessário de conhecimento para aqueles que possuem posse ou porte de arma de fogo. O Erro de Tipo.
Erro de Tipo - Qual a importância de um possuidor de arma de fogo saber?
Qual a importância? Simples. Aquele que opera uma arma de fogo possui poucos segundos, quando os possui, para tomar uma decisão aparentemente simples, mas que causará consequências talvez irreversíveis para si e outrem: o de acionar a tecla do gatilho e atingir pessoas embasado em uma excludente de ilicitude,apontado elementos fáticos que levaram o atirador a tomar a decisão certa. Certa mesmo? Será? Veremos:
No Código Penal Comum;
Art.20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
§1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.
§2º- Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.
§3º- O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queira praticar o crime.
Ao interpretar a Lei, verificamos que os motivos o qual levaram um atirador civil ou agente da Lei civil a reagir ao assalto e periclitação de vida de outrem são justificáveis: Podemos verificar no vídeo:
- uma motocicleta em fuga de outra moto com duas pessoas em velocidade acima do normal;
-cometimento de transgressões de trânsito;
- nervosismo demonstrado pelo condutor da motocicleta em fuga;
-manobras evasivas da motocicleta à vanguarda;
-manobras de perseguição da motocicleta no encalço da primeira;
- mãos do garupa sempre dentro dos bolsos da blusa, como se algum objeto ali segurasse, provavelmente arma de fogo, ao invés de segurar nas barras de segurança da moto;
- estalos que podem ser interpretados como disparos de arma de fogo;
-parada da motocicleta em fuga compelida pela motocicleta que realiza a perseguição;
-desembarque do garupa e mediante grave ameaça e tom imperativo de voz realiza abordagem e tomada de bens materiais.
Porém, embasado nisso poderia um cidadão possuidor de arma de fogo defender a iminente ou atual agressão com disparos de arma de fogo?
No Código Penal Militar;
Art. 36- É isento de pena quem, ao praticar o crime, supõe, por erro plenamente escusável, a inexistência de circunstância de fato que o constitui ou a existência de situação de fato que tornaria a ação legítima.
§1- Se o erro deriva de culpa, a este título responde o agente, se o fato é punível como crime culposo.
§2- Se o erro é provocado por terceiro, responderá este pelo crime, a título de dolo ou culpa, conforme o caso.
Guilherme de Souza Nucci em seu livro "O Código Penal Militar Comentado" aponta: "o agente que pratica o crime, supondo a inexistência de elemento fático constitutivo do tipo, quando escusável, afasta o dolo, que termina por não abranger todos os elementos do tipo penal (...). Entretanto, sendo integralmente escusável o erro do agente, afasta-se também a culpa, absolvendo-se o réu."
Em outras palavras, a aplicação do Erro de Tipo precisa ser integralmente escusável, ou seja; não haver possibilidade de descoberta da verdade. Frente a tal inóspita situação, como poderia o cidadão que possui arma de fogo, seja no interior de sua residência ou vislumbrando a situação em via pública, evitar a tragédia? Afinal... se porventura os jovens da moto que realizaram a "abordagem" fossem baleados, teríamos uma tragédia em larga escala. Como evitar portanto?
A solução: Uso progressivo de Força
Percebam que na Lei, seja Código Penal Comum ou Código Penal Militar, existe um apontamento: Caso os fatores sejam escusáveis ( os fatores levam a crer piamente que o vídeo se trata de uma tentativa de assalto) há o afastamento do dolo, mas não necessariamente da culpa. Temos aí a diferenciação daquele que pode agir em função do dever e aquele que deve agir em razão da profissão. Logo, o atirador civil que age assume as consequências de seus atos, devendo demonstrar por elementos fáticos o que acreditou ver, no vídeo, o assalto.
Independentemente da imaturidade, como pode aquele que age em legítima defesa armada evitar uma tragédia em sua vida e na dos autores do vídeo? Através do uso progressivo de força.